Buda, os cegos e o elefante! Religião plural e verdades relativas?

 


Quando o “pluralismo religioso” é atrelado ao relativismo deixa de ser meramente descritivo - afirmando que há diferentes religiões. Ao contrário, pluralismo religioso significa que de alguma maneira todas as religiões deferentes são verdadeiras. Uma parábola budista oferece uma ilustração popular dessa ideia:

Uma vez, um grupo de pessoas em busca de uma religião de diferentes tradições se reuniu e começou a debater a natureza de Deus. Apresentando respostas diferentes, começaram a discutir entre si sobre quem estava certo e que estava errado. Finalmente, quando não havia mais nenhuma esperança de conciliação, chamaram Buda e pediram-lhe que dissesse quem estava certo. Buda começou a contar a seguinte história:

“Era uma vez um rei que pediu aos seus servos que lhe trouxessem todos os cegos de uma cidade e um elefante. Em pouco tempo havia seis cegos e um elefante diante dele. O rei ordenou que os cegos apalpassem o animal e o descrevessem. ‘Um elefante é como um grande pote de água’, disse o primeiro que tocou a cabeça do elefante. ‘Majestade, ele está errado’, disse o segundo, enquanto tocava uma orelha. ‘Um elefante é como leque’. ‘Não’, insistiu um terceiro, ‘um elefante é como uma serpente’, disse enquanto segurava sua tromba. ‘Pelo contrário, todos vocês estão errados’, disse um quarto segurando as presas, ‘um elefante é como duas pontas de um arado’. O quinto homem ponderou e disse: ‘Está claro que um elefante é como uma coluna’, enquanto abraçava uma das pernas traseiras do animal. ‘Vocês todos estão errados’, insistiu o sexto. ‘Um elefante é uma longa serpente’, e levantou a cauda. Todos começaram a gritar com os outros sobre suas convicções da natureza do elefante”. Depois de contar a história, Buda comentou: “Como vocês podem ter tanta certeza daquilo que não podem ver? Todos nós somos como cegos neste mundo. Não podemos ver Deus. Cada um de vocês pode ter razão em parte, mas ninguém está completamente certo”.

Na última frase temos uma boa descrição do que é pluralismo religioso. Ele afirma que todas as religiões são parcialmente verdadeiras. Mais do que isso, o pluralismo religioso, ganha certo impulso porque sua afirmação da verdade parcial de todas as religiões se apoia na noção de que nenhuma pode ter a verdade toda. Essa é uma das coisas que faz o pluralismo religioso ser tão atraente para tantos. É óbvio que ninguém pode ter toda a verdade. Se isso é verdade, quais opções existem quando se trata de religião?

O relativismo é o “mais velho” de seu irmão menor e mais religioso. Tratar o relativismo primeiro também ajuda os cristãos a entender as questões em torno do pluralismo religioso.

Na parábola budista do elefante, o pluralismo religioso é produto das limitações humanas. Seu argumento é que deveríamos dizer que todas as religiões são pelo menos parcialmente verdadeiras, pois só somos capazes de “ver” ou “sentir” de forma limitada. O pluralismo religioso reconhece a finitude da existência humana de considerar outros pontos de vista igualmente legítimos.

É impossível argumentar contra a noção de que todos nós somos limitados, às vezes gravemente. Mas há outra premissa da parábola do elefante que pode não ser tão óbvia. De algum m odo estabeleceu-se que o que cada um dos seis homens “sente” em sua maneira própria e limitada é um elefante. Como sabemos que o que os seis homens estão apalpando partes de um elefante, e não de um rinoceronte, um hipopótamo, ou uma rocha, ou uma montanha, ou...? A premissa da parábola é que todos estão cientes da mesma coisa, mas e forma diferente. Como podemos saber isso?

Para ser justo, a parábola tenta ilustrar como pessoas religiosas podem ter visões diferentes do mesmo Deus. O elefante representa o Deus dessas diversas religiões.

Porém isso só aumenta o problema. Se o elefante representa o mesmo Deus, então a parábola não começa com uma premissa que é tudo, menos clara? Ela não pressupõe que, independentemente de como uma religião entende Deus de outra religião, talvez até mesmo de uma religião que contradiz a nossa.

Por exemplo, de modo geral o budismo crê que há muitos deuses, e nenhum deles é um criador. Dependendo da versão específica, o hinduísmo pode declarar um deus, ou muitos, ou que o mundo é deus.

Então, poderíamos perguntar, como esses pontos de vista podem ser simplesmente “parte” de um elefante maior, uma verdade maior? Se o elefante representa Deus, então algumas religiões afirma que há muitos elefantes, não só um, ao passo que outras podem dizer que talvez não haja elefante. Evidentemente a parábola budista não sustenta sua esperança de aceitação do pluralismo religioso.

A parábola está certa, contudo, ao mostrar que nós seres humanos somos limitados, tão limitados que não é possível que algum de nós, ou que todos nós juntos, adquiramos um conhecimento abrangente de Deus. Até aí isso é verdade.

Isso nos leva diretamente ao motivo pelo qual os cristãos afirmam que Jesus Cristo é o único caminho para Deus. Ajustando um pouco a parábola budista, os cristãos afirmam que há apenas um caminho para conhecer adequadamente o elefante. Essa afirmação não é arrogância pessoal. Nem declaração de conhecimento ilimitado. [...] é uma afirmação que leva a sério o fato e a natureza da revelação divina.

O cristianismo oferece uma razão transcendente para reconhecer o mundo como criado e os seres humanos como dotados de modo especial com a imagem de Deus na criação. Essa é uma razão transcendente porque, conforme começam as Escrituras (a Bíblia), reconhecemos que antes que todas as coisas começassem, Deus era. Deus, que transcende a criação, cria todo o resto.  Ele não se transforma nessas coisas, nem é o lado “espiritual” da humanidade. Ele cria e outorga o presente de sua imagem a todos os seres humanos.

Os problemas que se seguem à boa criação de Deus devem-se à rebelião de Adão e Eva contra Deus. Parte dessa rebelião foi ostentar a vida que Deus lhe dera, uma vida que deveria durar para sempre, se Adão e Eva tivessem obedecido. Deus lhes prometera que, se não lhe obedecessem, iriam morrer (Gênesis 2.17). Essa morte foi prometida por Deus; era o que mereciam por terem rejeitado a vida que Deus lhes dera no jardim. Não apenas isso, mas porque Deus havia designado Adão como  cabeça da raça humana, seu pecado trouxe a morte para todos os que nasceram depois dele (Romanos 5.12-211; 1Coríntios 15.47-48).

No entanto, a morte não foi a última palavra de Deus. Pelo contrário, ele prometeu: “Porei inimizade entre você e a mulher, entre a sua descendência e a descendência dela; este lhe ferirá a cabeça, e você lhe ferirá o calcanhar” (Gênesis 3.15). Com a entrada do pecado, a promessa de Deus foi que haveria inimizade, ou conflito, entre aqueles que seguissem a progênie de Satanás e aqueles que seguissem a descendência da mulher. Em seu comentário sobre Gênesis 3.15, [o teólogo] John Bunyan diz: “As sementes são os filhos de ambos, mas a da mulher é especialmente Cristo (Gálatas 3.16). “Deus enviou seu filho, nascido de mulher” (Gálatas 4.4). Quer o entendamos de maneira literal ou figurada; visto que num mistério a igreja é a mãe de Jesus Cristo, embora naturalmente, ou segundo a sua carne, ele nasceu da virgem Maria e veio de seu ventre: mas seja como for, o inimigo é o mesmo, e poderosamente opôs-se a todo reino do diabo, e morte, e inferno; pela empresa, envolvimento e guerra que o Filho de Deus manteve contra eles, desde sua concepção até sua morte e exaltação à destra do Pai”.

A concepção cristã de que Jesus Cristo é o único caminho não começa no Novo Testamento, como se ensina às vezes. O fato de Cristo ser o único caminho para Deus na verdade começa no jardim do Éden, imediatamente depois da entrada do pecado no mundo.

O restante do Antigo Testamento testifica sobre esse único e exclusivo Redentor que virá resolver o problema que as pessoas produzem e propagam. A quantidade de passagens no Antigo Testamento que se referem a esse Redentor exclusivo é grande demais para que as resumamos. Talvez seja melhor ver essas passagens do Antigo Testamento nas palavras do próprio Jesus (João 8.48-59; Lucas 24.24-27).

Quando começamos a ler a totalidade das Santas Escrituras à luz dessas palavras do próprio Jesus e reconhecemos que “todos os profetas” falavam a respeito dele e que “todas as Escrituras” (que na época em que Jesus falou eram apenas o Antigo Testamento) devem ser entendidas como revelação dele. É fácil ver porque os cristãos defendem que Jesus é o único caminho até Deus. Ele tem sido o único caminho para Deus desde que o pecado entrou no mundo.

Esses resumos de Jesus mais com o foco em Cristo n o restante das Escrituras, oferecem o contexto apropriado para as palavras de Jesus aos seus discípulos no cenáculo. O cenáculo, ou sala de jantar no andar superior, foi o local para onde Jesus levou seus discípulos a fim de prepara-los para sua morte iminente, bem como para os próprios ministérios deles, que começariam após a ressurreição dele. Ele precisava que soubessem qual mensagem deveriam pregar à igreja depois que ele tivesse partido.

Quando Jesus recomenda que seus discípulos não se atemorizem com os acontecimentos vindouros, ele também lhes diz que, como seus discípulos, eles conhecem “o caminho” para onde ele vai (João 14.1-4). Tomé fica confuso com isso e confessa que os discípulos ainda não conhecem o caminho. Jesus responde: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vem ao Pai, a não ser por mim”.

Não pode haver declaração mais clara sobre a exclusividade do cristianismo. Jesus está falando sobre “o caminho” para a vida eterna, para o céu. “O caminho” pode ser entendido como um atalho, talvez um estilo de vida que se deve adotar para chegar a Deus. Jesus corrige esse conceito. Ele não está falando de um atalho ou estilo de vida. Ele está falando sobre si mesmo. Se alguém quiser chegar à presença de Deus, vir através de Jesus é o único meio de chegar a ele. Ele é o caminho.

Isso faz todo sentido quando reconhecemos o que nos separa de Deus e o que a Bíblia toda, de Gênesis 3 em diante, fala sobre essa separação. O que nos separa de Deus não é o fato de não desempenharmos as funções religiosas apropriadas, ou de não vivermos uma existência suficientemente boa. O que nos separa de Deus é o nosso pecado. E a única maneira de vencer o pecado é alguém tomar sobre si o castigo de nosso pecado – incluindo a morte, e vencê-la.

Só Jesus pode fazer isso. Ninguém mais. Por causa de nosso pecado, “Deus tornou pecado por nós aquele que não tinha pecado, para que nele nos tornássemos justiça de Deus” (2Coríntios 5.21). O problema sério e profundo do pecado, que começou muito tempo atrás no jardim do Éden, tem uma, e somente uma solução. Deus teve de providenciar a solução nele mesmo. O pecado nos tornou incapazes de derrotar o inimigo que  criamos.

Não há salvação em nenhum outro, pois, debaixo do céu não há nenhum outro nome dado aos homens pelo qual devamos ser salvos (Atos 4.11-12).

Trechos da Obra "Por que você acredita?", de K. Scott Olphint, ed.Thomas Nelson Brasil.  


Pr. Helbert Farinha.

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